segunda-feira, 6 de junho de 2016

Meu pedacin di chão


Eu só quiria um pedacin di chão
Pra semeá meus sonhos e dias
I alimentá os bicho i a famía
Sem pressa, sem patrão

Ah, eu quiria é pur dimais
Fincá raiz nesse mundão
I vivê sussegado, sem preocupação
Num cantin quarqué das Gerais

Memo qui fosse uns poco arquere, sabi
Numa tapera cum fugão di lenha
Fincado lá nos rincão di Minas
Oh, se eu quiria, cumpadi

Prantá abróba, mandioca, covi,
Limão i otras fruta rodicasa
Trabaiá duro todo santo dia
Pá vê si homi lá de riba mi ovi

Ah, como eu quiria, minha fía
Tê umas galinha i uns porco
Criá um gadin, módi fazê uns quejo
I vivê feliz junto da minha Maria

Meu Deus, bem queu quiria
Vórtá cuns trocado no borná
I achá umas terra boa preu comprá
É só o queu quiria

Oh, se quiria
Chamá us cumpadi pá pescá
Cunvidá us vizinho pá festá
Nas noiti de viola e canturia

Pois quando qui vejo uma vaquinha
Mugindo no arto duma serra
Pastanu ali, tranquila, sozinha,
Entre a neblina e o frio qui pinta a terra     

Me dá um treco no peitu
Um negóci mei sem jeitu
Queu num sei neim expricá
Num sei sié tristeza ou alegria

Só sei qui eu bem qui quiria,
Me livrá dessa agunia
De tê saído cedo de lá
E num podê mais vortá



Eduardo C. Mendonça

segunda-feira, 18 de maio de 2015

É NOITE





De repente fez-se noite
Em meus dias
Mas por que a surpresa
Se nos encontramos ontem,
Antes da meia-noite?
Eu e ela, a noite

Foi uma noite fria de verão
Noite fria em meu coração
Foi longa, quão longa aquela noite
De vigília, de alucinação

Mas eu esperava pelo dia,
Pelo sol ao amanhecer
Esperava a alegria,
O sol alto, ao meio-dia

Mas a noite, ah como é triste a noite
Quando não quer amanhecer
É como a alma de um poeta
Prestes a morrer

E morreu
O poeta está morto,
Cego, mudo, trôpego,
Em estado de decomposição

Mas ele ainda não deixou o mundo
Cava ao longe o seu túmulo
No abismo mais profundo
Entre a sua alma
E o seu coração

Eduardo C. Mendonça



quarta-feira, 30 de janeiro de 2013




SAUDADE

Mal dita ânsia entre pares ímpar feitos.
Eduardo C. Mendonça

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

SerTão Gerais








Que saudade do mato

Da velha porteira

Do meu manso regato

E daquela laranjeira



Que saudade matreira

Da galinha e do pato

Daquele povo pacato

Da moça toda faceira



Não é saudade pequena

De querer buscar rapadura

Encontrar saracura

E ouvir a seriema



É saudade ingrata

De ver chuva na terra

De subir colina e serra

E beber garapa



É saudade do jipe

Dos brinquedos de lata

De fazer piquenique

E amolar a faca



Não é saudade da escola

Ou dos tempos de bola

É de tomar pinga

E água na moringa



Nem saudade vazia

É de “querê arriá o tordio”

Passar manteiga no “mio”

E da passarinhada que pia



É saudade de preparar o arado

De história de assombração

Vontade tocar o gado

E de ver procissão



É saudade daquele simples café

Do “paieiro” na varanda

Do fogão de lenha com chaminé

E das meninas em ciranda



É saudade do carro de boi

Que roda como o tempo

Saudade do que já se foi

De luar, estrela e relento



É saudade dura

“Qui as veis endoidece, otras cura”

Mais é saudade “dimais”

Saudade de SerTão Gerais





Eduardo C. Mendonça


quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Uma Mão Se Estende




No choro comprimido
Ou na derrota do dia
No prêmio merecido
E na dispensa vazia

Na saúde que cai
Ou num tombo no barro
No amor que se vai
E num acidente de carro

Na hora do aperto
E na saudação
Na hora do acerto
E na comunhão

Em porres nos bares
No rosto que lavo
No desabamento de lares
E nas batalhas que travo

No livro que leio
Ou na vida que termina
Em cada receio
E na voz que ensina

Na dor da enchente
Ou na filha perdida
No obstáculo à frente
E pra curar a ferida

No comércio, no morro,
E em forma de prece
Estendida a socorro
A mão se oferece

Te cobre, te despe,
Te liberta, te tolhe,
A mão que te acolhe
É a mesma que fere


Eduardo C. Mendonça